Alta tensão para quem depende de medicamentos de farmácia pública: dos 217 oferecidos na rede estadual, 85 estão total ou parcialmente em falta. Governo credita escassez à crise
João Henrique do Vale/Site Estado de Minas
Postado em 23/06/2019 06:00 / Atualizado em 24/06/2019 07:20
A imagem da capa do site Multisom foi retirada de arquivos da internet/Google
Desabastecimento total ou parcial de 85 dos 217 remédios distribuídos gratuitamente no programa Farmácia de Minas, 13 deles fornecidos pelo Ministério da Saúde, num quadro que persiste no estado. Entre as substâncias em falta estão drogas para tratar de hipercolesterolemia, acne e epilepsia. No momento, nem mesmo imunossupressores, que são usados por pessoas transplantadas, para que o corpo não rejeite o órgão recebido, têm abastecimento regular, embora estejam a caminho das prateleiras, segundo a Secretaria de Estado de Saúde (SES/MG). O órgão informa que o estoque desse item foi regularizado e que os medicamentos serão entregues às farmácias da rede até terça-feira. A pasta ressalta que a falta dos medicamentos tem relação com a crise financeira vivida por Minas Gerais.
Drama em dose dupla para quem precisa dos remédios para viver – alguns deles de alto custo – e ainda têm que enfrentar a incerteza no vaivém dos estoques da saúde pública. O aposentado José Pereira Vieira da Silva, de 59 anos, vive de perto o drama da falta de medicamentos. O filho dele, Paulo Augusto Secundino Vieira, de 24, morador de Belo Horizonte, passou por um transplante de rim há um ano e 11 meses. Por isso, precisa fazer uso de imunossupressores distribuídos pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Desde o início deste ano, entretanto, ele sofre com a falta de medicação e chegou até a ser internado por isso. Paulo faz uso da Ciclosporina.
“Essa falta de medicamentos vem ocorrendo desde outubro, mas o remédio do meu menino começou a faltar em janeiro. Uma caixa custa R$ 800 e dura apenas 15 dias. Na segunda semana de junho, o remédio voltou a ser distribuído, então, conseguimos para este mês. Mas antes meu filho chegou a ficar internado por uma semana para tomar a medicação. Isso é ruim, pois ele não está doente e no hospital pode acabar contraindo algo. Além disso, ocupa a vaga de outras pessoas”, contou José da Silva.
No meio da falta de distribuição, José, que está afastado do trabalho pelo INSS, teve que recorrer a doações para conseguir os medicamentos. “Estou desempregado e tive que colocar uma prótese no joelho. Conseguimos comprar o medicamento com base nas doações. Inclusive, consegui um pouco em Florianópolis”, afirmou. Mesmo com a reposição, ele teme que a situação volte a ficar crítica. “O medo sempre fica”, resumiu.
"O remédio do meu menino começou a faltar em janeiro. Uma caixa custa R$ 800 e dura só 15 dias. Na segunda semana de junho, voltou a ser distribuído, então, conseguimos para este mês (...). Mas o medo sempre fica"
José Pereira Vieira da Silva, aposentado, pai de rapaz que toma Ciclosporina continuamente
CONTINUIDADE
Vice-presidente da Associação Brasileira dos Centros de Diálise e Transplante (ABCDT), Marcos Vieira reforça que os pacientes transplantados precisam tomar os imunossupressores continuamente. A medicação adapta o sistema imunológico para que ele não rejeite o órgão como um corpo estranho. “Se não usar os medicamentos, a tendência do paciente é entrar em um processo de rejeição do órgão”, diz. Segundo ele, a rejeição pode ser causada por vários fatores, entre eles a interrupção total ou alteração na dose do medicamento. Neste último caso, ele cita como exemplo pessoas que começam a tomar metade da dose do imunossupressor para que ele acabe mais lentamente diante dos problemas na distribuição do medicamento.
“É uma 'doença crônica' a falta de remédio para os pacientes. A gente precisa de uma política de manutenção contínua dessas medicações para os pacientes renais. Até porque o paciente que fica sem tratamento pode ter uma sobrevida menor”, explica Vieira, ressaltando que os casos de pacientes transplantados de fígado ou coração são mais graves, já que a rejeição pode até levar à morte.
RESPOSTA
Sobre a falta dos imunossupressores, a SES/MG informou, por meio de nota, que os medicamentos Tacrolimo, Ciclosporina e Micofenolato de sódio encontram-se com o abastecimento regularizado a nível central. Os remédios “estão em processo de distribuição para todas as farmácias regionais do estado, com previsão de entrega até 25 de junho”, indicou.
A pasta informou que o Ciclosporina 50mg cápsula se encontra com estoque reduzido devido a pendência financeira por parte da SES-MG com o fornecedor. No entanto, a previsão é de que o abastecimento seja regularizado esta semana e que o item seja distribuído a todas as regionais de saúde estaduais. “A SES-MG entende que é de suma importância o fornecimento regular do medicamento em questão e tão logo o item seja entregue em nosso almoxarifado será autorizada a distribuição a todas as regionais de saúde do estado”, finalizou. (Colaborou Cristiane Silva)
Memória - Problema contínuo
A falta de distribuição dos medicamentos é um problema que vem sendo vivido em Minas Gerais há tempos. Em janeiro, o Estado de Minas mostrou que dos 217 remédios distribuídos gratuitamente no Farmácia de Minas, 97 estavam desabastecidos ou parcialmente abastecidos, sendo que 74 tipos de medicação estavam com o estoque zerado. A situação ainda persiste crítica. Segundo a SES, atualmente, 85 medicamentos encontram-se desabastecidos ou parcialmente abastecidos. Sendo que, desses, 13 itens são fornecidos pelo Ministério da Saúde. Entre os remédios que estão em falta estão drogas para o tratamento de hipercolesterolemia, acne e epilepsia.