Com baixo crescimento, supermercados querem vender remédios
Economia
Publicado em 06/02/2019

Representante dos supermercados aposta nas reformas, em especial a da Previdência, para destravar os investimentos e pede ao novo governo a liberação da venda de medicamentos

 

Por Paula Pacheco/Site Estado de Minas

Postado em 06/02/2019 07:42 / Atualizado em 06/02/2019 09:53

A imagem da capa do site Multisom foi retirada de arquivos da internet/Google 

 

São Paulo – As vendas do varejo cresceram apenas 2,07% em 2018, uma marca inferior aos 3% projetados no início do ano pela Associação Brasileira de Supermercados (Abras). Boa parte desse desempenho veio do atacarejo, ou cash & carry (C&C), uma modalidade que costuma ganhar espaço conforme a economia vai mal.

 

De acordo com dados da Nielsen, esse canal representou 37,9% do volume de vendas do varejo e apresentou um crescimento de 13,9% na comparação com o desempenho de 2017. A modalidade supermercado vem em segundo lugar, com 31% de participação, mas o resultado foi 2,6% acima do que no ano anterior. A maior perda, no entanto, foi nos hipermercados, com queda de 5,9%, chegando assim a uma fatia de 13,5%.

 

João Sanzovo Neto, presidente da Abras, acredita que haverá uma melhora na economia e isso irá se refletir no desempenho do setor neste ano. Para isso, conta com a aprovação das reformas, especialmente a da Previdência, o aumento da confiança dos empresários e dos investimentos, além da geração de mais postos de trabalho.

 

“Em 2018, não conseguimos alcançar a previsão do início do ano. Toda a movimentação da greve dos caminhoneiros e a incerteza política fizeram com que a economia não deslanchasse como se esperava. Agora, trabalhamos com a previsão de crescimento para 2019 de 3%”, diz Sanzovo.

 

Toda a movimentação da greve dos caminhoneiros e a incerteza política fizeram com que a economia não deslanchasse como se esperava. Agora, trabalhamos com a previsão de crescimento para 2019 de 3%%u201D

João Sanzovo Neto, presidente da Abras

 

 

DE BEM COM O GOVERNO 

 

Boa parte do otimismo de Sanzovo vem dos dois encontros que teve com ministros do novo governo: Onyx Lorenzoni, da Casa Civil, e Paulo Guedes, da economia. “O otimismo que temos se dá mais pelo diálogo. Isso está se dando porque o discurso do governo, especialmente do ministro da economia, é muito alinhado com conceitos, com ideologias que o empresariado acredita, como o liberalismo econômico, a diminuição do papel do estado. Essas são questões que deixam empresários otimistas”.

 

Entusiasmado com Guedes, Sanzovo conta: “Confesso que tive de me beliscar (nos encontros). Se ele fizer metade do que se propõe, já colocará o Brasil no caminho. O que ele disse foi uma música para os ouvidos dos empresários, o que faz com que se sintam motivados para crescer”.

 

No entanto, caso as promessas de campanha não se confirmem, esse clima pode deixar de dominar as conversas na Abras. “Se houver algum retrocesso na força das reformas, especialmente da Previdência, vai derrubar o índice de confiança. Não parece que isso possa acontecer. A eleição para a presidência do Senado é mais uma demonstração de que o governo ganha força para levar reformas a cabo”.

 

 

REMÉDIO NO SUPERMERCADO 

 

Além de contar com o poder de execução do novo governo, o setor varejista atua em outra frente. As redes de supermercado não abandonaram o projeto de passar a vender medicamentos isentos de prescrição médica, os chamados MPIs. Em maio do ano passado, durante evento realizado em São Paulo, o ex-presidente Michel Temer (MDB) prometeu ao setor avaliar o pedido. Meses antes, em fevereiro, um Projeto de Lei (PL) com essa proposta foi apresentado pelo então deputado Ronaldo Martins (PRB/CE), que não foi reeleito, por isso a proposta foi arquivada.

 

O último movimento na Câmara dos Deputados, de acordo com o site da Casa, foi em novembro passado, quando houve uma audiência na Comissão de Seguridade Social e Família. No encontro, representantes de setores ligados à discussão, como o Conselho Federal de Farmácia, Abras, Agência Nacional de Vigilância Sanitária e Ministério da Saúde, apresentaram prós e contras sobre a liberação da venda de MIPs em supermercados.Continua depois da publicidade

 

Quem critica a proposta da Abras diz que incluir os supermercados entre os que estão autorizados a vender remédios é um estímulo a automedicação, o que pode resultar no surgimento e até no agravamento de doenças.

 

ACESSO 

 

Os defensores, no entanto, dizem que a capilaridade do varejo é maior do que as farmácias apresentam hoje, por isso a alteração na lei traria como benefício a inclusão de pontos de venda de medicamentos em cidades onde não há outro canal de venda.

 

Além disso, citou um dos apoiadores durante a audiência na Câmara, no modelo atual, em que MPIs podem ser vendidos nos sites das farmácias, já é possível fazer as compras sem a assistência física de um farmacêutico. O arquivamento do PL data de 31 de janeiro, último dia do mandato legislativo de Martins.

 

Agora, com um novo governo, os executivos da Abras trataram de levar aos ministros de Jair Bolsonaro (PSL) a proposta para a aprovação das novas regras para os MPIs, conforme confirmou Sanzovo. Segundo o representante do setor, nos Estados Unidos já é possível comprar esse tipo de medicamento até mesmo em vending machines. Segundo a Associação Brasileira da Indústria de Medicamentos Isentos de Prescrição (Abimip), 60% dos países admitem a venda desses itens fora de farmácias.

 

Segundo Sanzovo, no Brasil já foi permitido aos supermercados a venda de MIPs e na época houve uma redução de até 35% nos preços. O presidente da Abras defende que Ministério da Saúde e Anvisa passem a olhar de outra forma para o pedido do setor.

 

SEM TABELAMENTO 

 

Diante da possibilidade de os supermercados poderem ser canais de venda dos MPIs, Sanzovo advoga até mesmo o fim do tabelamento de preço dos medicamentos. “O setor farmacêutico passa há muitos anos por preços controlados. O governo tem uma interferência que chega no consumidor. Isso tem de ser revisto para se chegar à livre concorrência. As farmácias precisam ter liberdade de competir, de serem mais eficientes e de oferecerem preços melhores do que aquele que o governo estipula. Se não tivesse controle de preço elas seriam mais eficientes”, diz.

 

Vida longa ou curta para o atacarejo?

 

Apesar da taxa de crescimento do atacarejo ter sido a maior em 2018, João Sanzovo Neto, presidente da Abras, pondera que o crescimento poderá perder força conforme a economia reagir.

 

Segundo Sanzovo, neste ano já deverá ser possível ver esse canal do varejo ainda em expansão em algumas regiões do país e chegando à estabilidade em outras. “Com a melhora da renda, a comodidade começa a ter um peso maior do que o preço dos produtos.

 

O consumidor cada vez mais omnichannel, mesclando diferentes canais de compra. Ora recorre aos atacarejos, ora procura os supermercados perto de casa. Para este ano, imagino que haja uma estabilização no cash & carry e uma pequena recuperação nos supermercados convencionais”, avalia.

 

No entanto, o presidente da Abras prefere não arriscar um palpite sobre o modelo de hipermercados – o que mais vem perdendo terreno nos últimos anos. Para contornar o problema da queda nas vendas, algumas redes vêm optando por adaptar as lojas desenhadas de acordo com esse conceito para que passem a operar como atacarejo.

 

Apesar do otimismo quanto à vida ainda longa do atacarejo, Sanzovo lembra que no passado esse modelo foi implantado no país com bandeiras como Superbox, mas que a aposta não foi adiante. “Não dá para só olhar no curto prazo porque esse é um setor muito dinâmico. O consumidor cada vez mais tem novas opções e isso exige uma dinâmica muito grande dos empresários”.

 

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