O governo não deverá abrir mão da proposta de antecipar a alfabetização das crianças para o 2º ano do ensino fundamental, como está previsto no texto da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) enviado pelo Ministério da Educação (MEC) ao Conselho Nacional de Educação (CNE).
Atualmente, as diretrizes curriculares determinam que o período da alfabetização deve ser organizado pelas escolas até o 3º ano do ensino fundamental. Esse também é o prazo previsto no Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa, que estabelece que todas as crianças estejam alfabetizadas até os 8 anos de idade. No entanto, o texto da Base Nacional encaminhado ao CNE prevê que as crianças deverão ser capazes de ler e escrever até o 2º ano do ensino fundamental, geralmente aos 7 anos.
O secretário de Educação Básica do MEC, Rossieli Soares da Silva, disse hoje (11) que a pasta poderá até avaliar alguma mudança proposta pelo Conselho, mas mantém sua convicção no modelo apresentado, que prevê a codificação da alfabetização até o 2º ano.
“As crianças mais ricas já estão plenamente alfabetizadas ao final do 2º ano. Por que não devemos brigar pelo direito para as crianças que mais precisam? A convicção do MEC está mantida neste sentido. Qualquer posição que vier do CNE o Ministério vai avaliar, mas hoje temos essa convicção desse ponto internamente no ministério”, disse Silva à Agência Brasil.
O presidente da comissão do CNE responsável pela análise da Base Nacional Comum Curricular, César Callegari, acredita que pode haver uma convergência entre as posições do Conselho e do Ministério da Educação sobre o assunto. “O tema será objeto de diálogo com o MEC antes de chegar a uma finalização aqui dentro. A ideia é que a gente tente buscar convergência naquilo que pode representar um avanço e continue discutindo temas que não são tão essenciais e que se ficarem com um ponto de impasse poderia atrasar todo o processo da Base”.
O texto da Base deverá ser analisado pelo CNE até dezembro. Até agora, cerca de 2 mil contribuições foram enviadas para aperfeiçoar o documento, que define os direitos e objetivos de aprendizagem e desenvolvimento para todos os alunos da educação básica do país. Depois de aprovado pelo CNE, o texto será encaminhado para homologação do ministro da Educação.
Ideologia de gênero
Hoje, o CNE realizou a última audiência pública em parceria com o MEC para receber contribuições para a Base Nacional. Um dos pontos mais debatidos foi a forma como as questões de ideologia de gênero e de orientação sexual devem ser tratadas no documento. Durante a audiência, médicos e professores se manifestaram contra a abordagem das questões de gênero no texto.
A representante da Associação de Médicos pela Diversidade, Carla Dorgam, disse que a ciência desmonta a ideia de que as crianças nascem indiferentes em relação ao gênero. “Não há embasamento científico nenhum que sustente ideologia de gênero, portanto não há nada que justifique aplicá-la nacionalmente, em toda a rede pública de ensino”, disse.
Já o chefe de Educação do Fundo das Nações Unidas para a Infância no Brasil, Ítalo Dutra, disse que a garantia das expressões “orientação sexual” e “identidade de gênero” no texto da Base é importante para a proteção dos direitos de crianças e adolescentes. “Essa discussão é importante para dar visibilidade às necessidades de aprendizagem de muitas crianças brasileiras que são vítimas de racismo, homofobia, transfobia durante toda a sua existência.”
O secretário de Educação Básica do MEC explicou que a Base traz uma redação que trata das diversidades de maneira geral, entre elas, as diversidades de gênero, de opção sexual, de etnias. “Nós entendemos que a redação está em um ponto adequado, mas agora cabe ao CNE fazer qualquer apresentação de contraproposta ao Ministério da Educação. Estamos próximos para sentar e discutir todos os temas”, disse Silva.
De acordo com o conselheiro Callegari, as sugestões apresentadas ao colegiado vão ser consideradas, assim como todas as outras recebidas, mas ressaltou que o assunto já é tratado nas diretrizes curriculares que estão em vigor atualmente. “O Conselho não cogita revogar as diretrizes curriculares que estão vigentes hoje no país. E todas elas fazem referências explícitas aos cuidados que a escola deve ter no que diz respeito à discussão desses temas como gênero, orientação sexual. Então, isso não pode ser ocultado de um documento da Base Nacional Comum Curricular”, ressaltou.
Desde julho, a BNCC vem sendo debatida em cada região do país, e já foram realizados encontros em Manaus, Olinda (PE), Florianópolis e São Paulo.
Edição: Luana Lourenço