Ao esquecer o “Lulinha paz e amor”, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva atacou o juiz Sérgio Moro e se colocou oficialmente como candidato à Presidência da República no primeiro pronunciamento após ser condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. “Quem acha que é o fim do Lula vai quebrar a cara, porque quem tem direito de decretar meu fim é a população brasileira”, afirmou. O tom do discurso dá uma amostra da linha com que o Partido dos Trabalhadores pretende conduzir a eventual campanha. Entretanto, são muitos os entraves políticos e jurídicos no caminho.
Dentro do PT, o discurso oficial é unânime: Lula é o plano A, B e C, e a legenda não considera alternativas. A presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann (PR), diz que a condenação tem o objetivo de tirá-lo da disputa e a legenda não aceitará uma eleição sem Lula. “A condenação é política e não vamos aceitar. Ou deixam o Lula participar e ganham dele nas urnas ou darão um novo golpe, que será uma fraude eleitoral”, disse em entrevista publicada pelo Correio nesta semana.
Entre as lideranças petistas, a retórica se repete, porém, nos bastidores, fala-se que Lula é o plano A do PT porque é o único. Devastada pelas denúncias de corrupção e tendo perdido o poder nos municípios, nos estados e no governo federal nos últimos anos, a legenda se apoia na estrela que ainda brilha, sustentada pelas pesquisas eleitorais, que mostram o ex-presidente na liderança com média de 30% e 40% dos votos. A intenção da cúpula do PT é protelar ao máximo o julgamento final para até depois de uma eventual vitória na eleição e da diplomação. Além disso, os caciques petistas pretendem questionar todos os passos da tramitação do processo no TRE-4.
Sucessor
Além disso, conta um petista que prefere não se identificar, o próprio Lula não permitiu que outro nome crescesse como um sucessor natural. “É a personalidade centralizadora e dominadora dele, não deixa ninguém ir muito longe. E ele precisa ser o candidato até para sustentar a própria defesa. E será que ele tem tanta luz agora que conseguiria iluminar outro poste?”, questiona, em referência à ex-presidente Dilma Rousseff, que foi lapidada por Lula para chegar ao posto, ou até mesmo o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad.
Na opinião do professor do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB) Ricardo Caldas, Lula está sem alternativa, como em um jogo de pôquer, onde já se perdeu muito e agora só resta apostar as fichas que sobraram contra a banca para tentar recuperar algo. “É uma escolha de Sofia. Se ele for para um lado, vira presidente da República. Para o outro, ele vai para cadeia. Olha a ironia. São as opções que ele tem na vida. Qualquer um faria a mesma coisa”, analisa.
Debandada
Só que, além de contar com a derrubada da condenação em segunda instância ou um não julgamento até as eleições, o presidente terá desafios políticos complexos pela frente. Primeiro, uma debandada interna. Dentro do partido, há aliados inseguros que pensam em começar um plano B. O próximo problema é a rejeição, em torno de 40% nas pesquisas. Segundo Caldas, os números de Lula nos levantamentos indicam um eleitorado fiel ao ex-presidente e não há muita margem para expansão. “Quem o rejeita não vai mudar de opinião.”
Fora isso, apesar de ter a simpatia dos partidos de centro-esquerda, será muito difícil a formação de uma coligação partidária que dê sustentação à candidatura de Lula. Amigo e aliado do petista, o presidente do PDT, Carlos Lupi, acredita que a decisão do juiz Moro será revertida em segunda instância, mas, mesmo assim, defende que as siglas do campo popular precisam se unir em um projeto em comum. Questionado se abriria mão de lançar candidato próprio, Lupi garante que Ciro Gomes será o nome do PDT à Presidência. “Essa eleição será semelhante à de 1989, com vários candidatos, todos dizendo que são limpos. Ciro é um cara de opinião e a população está sedenta por opinião, por alguém que tenha coragem de dizer o que precisa ser dito.”
Cenários
Do lado jurídico, caso seja condenado por um colegiado de juízes, como é o caso das turmas do TRF-4, Lula ficará inelegível, de acordo com a lei da Ficha Limpa. “Pela sentença do juiz Moro, é possível que o ex-presidente fique inelegível caso a condenação seja confirmada em segunda instância. Mas, para isso, a sentença do TRF tem que sair antes da eleição. Se o pleito fosse hoje, ele poderia concorrer normalmente”, explica a professora Karina Kufa, do Instituto de Direito Público de São Paulo. Caso o ex-presidente seja julgado após o registro de candidatura, que pode ser feito até 5 de agosto de 2018, o ato pode ser cassado ou concorrer sub judice.
Há também uma chance de que a candidatura de Lula seja impugnada por causa do entendimento, de acordo com a Constituição, de que réus não podem estar na linha sucessória da presidência da República. A alegação pode ser usada por adversários políticos para barrar a posse do petista, caso ele vença as eleições. “Se, enquanto réu, eu não posso estar na linha sucessória, imagina ser presidente? Isso vai ser suscitado na campanha e o Tribunal Superior Eleitoral terá de se posicionar sobre isso”, comenta Igor Pinheiro, coordenador da pós-graduação de direito eleitoral do CERS/Estácio de Sá.
Jararaca
Em março de 2013, após ser conduzido coercitivamente para prestar depoimento à Polícia Federal em São Paulo, Lula subiu o tom pela primeira vez em um discurso e afirmou que “se quiseram matar a jararaca, não fizeram direito, pois não bateram na cabeça, bateram no rabo, porque a jararaca está viva”.
Natália Lambert , Renato Souza/Site Estado de Minas - Postado em 14/07/2017 07:18 / Atualizado em 14/07/2017 07:42